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segunda-feira, novembro 24, 2003

Os fantasmas do Natal 

Por mais que me esforce, este ano ainda não consegui sentir aquele irresistível e inebriante sentimento de Natal.
É verdade que já se vêem pelas ruas os inevitáveis vendedores de castanha assada.
É verdade que já nos inundam com campanhas publicitárias a apelar ao Natal e ao espírito consumista que nos ataca por esta altura.
É verdade que já pelo menos três publicações diárias estão a distribuir diariamente peças de presépio, eu, por exemplo ando a coleccionar dois, mas sem frenesim, sem aquele interesse de outros anos, sem sorrir por dentro.
É verdade que já começaram as campanhas de solidariedade para com os mais desfavorecidos.
É verdade que o calendário cavalga e o Dezembro está mesmo aí ao virar da semana.
É verdade que já há Pais Natal por tudo o que é grande superfície comercial. É verdade, também, que o menino Jesus continua esquecido.
É verdade que se pressente que muito em breve, no meio da evocação de delicados róseos dedinhos ou magníficas níveas barbas estaremos uma vez mais a comemorar a quadra da paz.
Mas se calhar é mesmo aí que se encontra a chave deste súbito empedernir de alma, isto para além de nem o próprio frio, aquele frio rijo que tão bem assinala a época, ter ainda feito o seu aparecimento.
Ou se calhar é na paz, ou melhor na falta dela, que radica parte desta ausência, desta espécie de falta de comparência da minha parte, eu que como sabem de outros escritos natalícios sempre vivi estes tempos com genuína alegria.
Ou se calhar, ainda, é na instabilidade, neste viver no fio da navalha, neste assistir quotidiano a mortes permanentes, sem nunca sabermos o que virá, e onde virá, a seguir, terrível espada de Dâmocles pairando sobre cabeças que mesmo que não queiram, mesmo que tentem sacudir num abanar dessa mesma cabeça, não conseguem deixar de cogitar sobre tão tenebrosos assuntos assuntos !
Poderá também ser fruto da constante falha dos políticos e das suas políticas, sempre a cortar-nos aspirações legítimas e a semear raiva no húmus da desilusão constante.
É com toda a certeza na cada vez maior falta de solidariedade que todos os dias nos invade o espírito, desde o Médio Oriente às políticas do burgo.
Mas nos outros anos também havia conflitos e guerras poderão alguns dizer. É verdade mas parece-me que sentia menos angústia nos olhares das pessoas, havia mais brilho nesses mesmos olhares, e se a gripe se pega o olhar tristonho e a falta de alegria dos que nos rodeiam não se pega menos.
Poderão dizer, de igual modo que parcas políticas sempre houve, e chorudos impostos, pagos pelos que não podem fugir, também. Mas este ano parece-me pior o ânimo das pessoas com quem me cruzo, talvez por terem percebido finalmente que a Senhora Dona Ministra, penso que deve ser a única que dispensa o acrescentar da pasta exercida, não está a jogar correcto, segundo as regras, com eles, pois se aqui a atrasado garantia que não estava obcecada pelo défice, o que seria grave num governante, afinal, reconheceu, com toda a candura que afinal estava a cometer esse tal pecadilho de que a acusavam há já algum tempo.
Desculpem lá esta onda tão pouco usual neste espaço, mas é que estou mesmo um bocado abatido com os olhares que vejo à minha volta, com a tristeza interior que pressinto à minha volta, com a pouca vontade de espírito natalício que se vai evidenciando à minha volta.
E das duas uma ou eu, qual Scrooge, já vejo fantasmas onde eles não existem, desde o risonho e etéreo do Natal passado, passando pelo inconstante, volúvel e cinzento do Natal presente até ao soturno e atro do Natal futuro, ou estaremos então a sofrer os efeitos de um qualquer síndroma, que, talvez fruto de todos este negativismos, tem como sintoma mais evidente a sensação de que o anunciado e tão badalado luto estudantil, não se vai ficar pelas universidades mas sim alastrar qual epidemia a todo o Portugal.

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